terça-feira, agosto 25, 2009

Lina, "a técnica"

Engraçado que a imprensa acusava Lina Vieira de ser instrumento de uma partidarização da Receita Federal. A cada nomeação de superintendentes e diretores, havia acusação de aparelhamento. Agora, os mesmos analistas dizem que ela era uma "técnica" e que os "técnicos" por ela indicados estão sendo retirados para...aparelhamento da Receita. Eu estou louco ou é isso mesmo?

Vejam a evolução do Estadão:

Em 30 de outubro de 2008 (http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20081030/not_imp269322,0.php):

Ao vencedor, o desmanche
As piores previsões feitas quando da nomeação de Lina Maria Vieira para o comando da Receita Federal se concretizaram: o aparelhamento do aparato de fiscalização e arrecadação, uma das áreas ainda razoavelmente imunes ao loteamento partidário/sindical patrocinado pelo governo Luiz Inácio da Silva em setores-chave da administração federal.Trata-se de um plano bem planejado e gradativamente executado. Portanto, enquanto estiverem no manche do poder governantes com esse tipo de visão (utilitária) do Estado, nada há a fazer. Não adianta reclamar, denunciar, apontar os malefícios, os retrocessos, a ótica distorcida, o espaço aberto a ilicitudes e as intenções subjacentes, porque para tudo há uma justificativa quando a decisão de governo está tomada.Na Receita foram substituídos cinco dos seis secretários-adjuntos, os superintendentes de São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Espírito Santo e mais os responsáveis pelas regiões Norte e Nordeste, nos últimos três meses.Uma remodelação dessa amplitude em tão curto espaço de tempo, se fundamentada em motivações exclusivamente profissionais, teria necessariamente de ser acompanhada dos devidos esclarecimentos.Se algo andava mal na Receita, o contribuinte tinha o direito de saber. Se a partir da nova política de remanejamento de pessoal começaria a andar melhor, o governo seria o maior interessado na divulgação e poderia merecer aplausos.No lugar disso, o que se viu muito bem relatado na reportagem da edição de ontem do Estado foram trocas paulatinas na estrutura central e nas superintendências regionais feitas com o oficioso objetivo de substituir a "turma do Everardo" para pôr fim à influência do secretário na gestão Fernando Henrique Cardoso, Everardo Maciel.Mas, se o critério é nebuloso, a intenção é claramente exposta: dar lugar à "turma do Unafisco", o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais, de onde saíram os novos superintendentes. Concursados todos eles, aponta a reportagem. Só que não é a condição legal ou a capacidade técnica o que se discute, mas o comprometimento dos sindicalistas com uma causa política e o retrocesso - para não dizer o risco - que isso representa no tocante ao uso partidário da máquina do Estado.Numa área como a Receita esse tipo de controle pode ser uma arma de potência incomensurável sobre adversários, principalmente em períodos eleitorais. Se o governo ganhar a próxima eleição presidencial, os poucos avanços obtidos na despolitização da burocracia no governo anterior continuarão sendo anulados - exatamente como fez a aliança PMDB/PFL na Nova República em relação à estrutura herdada do regime militar - até o limite do imprevisível.Mas, se o vencedor for da oposição e tiver da administração pública uma visão profissional, vai se deparar com o desafio de desmontar o aparelho sindical antes mesmo de manifestar o tradicional repúdio ao loteamento partidário que preside as relações entre Legislativo e Executivo e impede o Brasil de ser governado por um projeto de País, mantendo-o atrelado a planos alternados de poder. Há quem trema só de pensar no enfrentamento do próximo governo com o PT se o partido porventura voltar derrotado da batalha de 2010 diretamente para a trincheira da oposição.Mas há quem lembre também que pior que o embate na base do grito e da cobrança será a resistência da aliança entre ideológicos e fisiológicos que, na defesa de seus interesses, vai se movimentar ainda na fase de escolha de candidaturas dentro dos partidos. De todos eles, os oposicionistas e os governistas por adesão ou por convicção.Lugar ao solSempre que algo ou alguém fortalece demais a posição do governador de São Paulo, José Serra, como candidato do PSDB à Presidência da República, o governador de Minas Gerais, Aécio Neves, cria um fato para lembrar que continua no jogo.Foi assim no início do ano, quando o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse que a melhor solução para os tucanos seria a reeleição de Gilberto Kassab na Prefeitura de São Paulo, Geraldo Alckmin candidato ao governo do Estado em 2010 e Serra na disputa pela Presidência.Aécio de imediato deu início a um périplo de conversas multipartidárias, lançou a tese da convergência possível entre PT e PSDB e deixou prosperar a impressão de que poderia mudar de partido para ser uma espécie de candidato da "unidade", quem sabe até com o apoio do presidente Lula.Agora acontece de novo. Quando Serra é saudado como o grande vencedor de 2008 e, por isso, apontado como a opção "natural" da oposição para 2010, Aécio prega a definição de candidaturas presidenciais mediante prévias.Não quer briga nem se apresentar à disputa interna desde já. Só põe um tema na agenda de maneira a defender a parte que lhe cabe no latifúndio da cena política nacional.

Receita perigosa
A primeira mulher na chefia da Receita Federal, Lina Maria Vieira, deixa o cargo duas semanas antes de completar um ano de gestão. Nomeação e demissão têm um importante ponto comum: uma e outra foram determinadas, em grande parte, por motivos muito mais políticos ? no sentido menos nobre dessa palavra ? do que técnicos. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, ofereceu-lhe o posto para se livrar de um importante remanescente da equipe de seu antecessor, Antonio Palocci. Isso nunca foi dito oficialmente, mas a explicação nunca foi um segredo. Também a demissão foi decidida sem a apresentação, pelo menos até ontem, de uma clara justificativa oficial. Segundo o noticiário, o desgaste político da secretária é atribuído, por fontes do governo, a vários fatores, mas o mais importante, se não o único realmente importante, foi a ação da Receita Federal contra a Petrobrás por causa de operações de "compensação de tributos" no valor de cerca de R$ 4 bilhões. Mantega protestou por não ter sido consultado e alegou sua condição de membro do conselho da estatal, como se isso tornasse obrigatório consultá-lo antes de qualquer medida fiscal contra a empresa. Lina Maria Vieira é funcionária da Receita desde 1976 e foi secretária da Fazenda do Rio Grande do Norte por duas vezes. Foi indicada ao ministro Mantega pelo secretário executivo do Ministério, Nelson Machado. O ministro procurava um substituto para Jorge Rachid, chefe da Receita nomeado pelo ministro Antonio Palocci. Rachid teve um bom desempenho no cargo, mas, segundo se comenta no Ministério da Fazenda, era considerado muito independente por Mantega e ainda tem prestígio entre os funcionários do Fisco.Se esperava uma secretária mais discreta e mais obediente às suas orientações, Mantega certamente se decepcionou. Lina Maria Vieira anunciou e pôs em marcha uma fiscalização mais severa das instituições financeiras. Não desagradou só aos banqueiros. Empresários de outros setores se queixavam de ter pouco acesso à Receita para discutir as questões de seu interesse. Tudo isso pode ser verdade, mas nenhum desses fatores é uma boa justificativa para se mudar a chefia do Fisco federal. Também se atribui à secretária a nomeação de sindicalistas para postos importantes em vários Estados. Mas, no governo do PT, o aparelhamento da máquina estatal com sindicalistas politicamente alinhados não é, nunca foi e provavelmente nunca será pecado. É difícil achar uma área da administração federal, direta ou indireta, ainda livre dessa praga. Também segundo o noticiário, há descontentamento no governo com a perda de arrecadação. Mas essa perda é atribuível essencialmente à recessão e aos incentivos fiscais a alguns setores considerados especialmente importantes pelo governo, como o automobilístico, o imobiliário e o de eletrodomésticos. É grotesco responsabilizar a secretária da Receita pela perda de arrecadação. Essa justificativa é uma ofensa à opinião pública.Restam, portanto, poucas explicações críveis para a demissão de Lina Maria Vieira. A nova secretária não se mostrou dócil e disposta a viver à sombra do ministro. Com personalidade própria, criou atritos dentro e fora do governo. Um desses atritos foi com certeza decisivo. Ao contestar o critério contábil da Petrobrás, a Receita colidiu com a maior estatal brasileira, responsável pela maior parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e um dos itens favoritos da retórica político-eleitoral do presidente Lula. O conflito surgiu porque a empresa mudou a escrituração, trocando o regime de competência pelo de caixa. Com isso, poderia expurgar parte de seus ganhos do lucro tributável e ganhar cerca de R$ 4 bilhões. A Receita contestou a mudança. A empresa, segundo o Fisco, deveria ter mantido o sistema adotado no começo do período fiscal. Esta é uma discussão para especialistas, mas o ministro da Fazenda condenou publicamente, e sem demora, a ação da Receita. Consequência inevitável: se a Petrobrás pode, por que não qualquer outra empresa? O ministro parece nem ter percebido esse pormenor. Com a demissão da secretária, a CPI da Petrobrás, com instalação prevista para hoje, tem mais um motivo para incluir aquele episódio em sua pauta. É um bom assunto para discutir com o ministro da Fazenda.

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